Existe
sempre uma lição a ser aprendida, seja qual for a situação que a vida lhe
apresente. Não posso provar isso, então, talvez, seja aqui o mais próximo que
chego de verdadeira e genuína fé. Toda situação, não importa qual seja, tem
algo a ensinar a qualquer pessoa que ela se apresentar. Assim, a greve geral
também tem algo a lhe ensinar, seja você de esquerda ou de direita, esteja você
aderindo ou não.
No meu caso, a greve
propôs uma série de reflexões, apesar de não exatamente as reflexões que os
organizadores – se é que existem –tentaram gerar.
Veja
bem, sobre a reforma da previdência eu refleti quando ela foi apresentada e
quando eu a estudei brevemente. Da mesma forma, refleti sobre a reforma trabalhista
quando tomei conhecimento do seu escopo e objetivo. Tenho minhas criticas a
ambas, mas não chego a me opor a elas. Prefiro o debate sobre elas do que a sua
rejeição. Não acho que sejam desnecessárias, muito menos tão prejudiciais
quanto as pintam.
Contudo,
a reflexão mais importante que essa greve me proporcionou até aqui foi sobre a
nossa vida em sociedade.
Vivemos
em um mundo capitalista – ainda bem - que preza o individualismo. A cultura
social também vem estimulando o individualismo, ainda que de uma maneira
comunitária. As brigas sociais tem seu foco no indivíduo, nos direitos e nas
liberdades individuais, na igualdade entre indivíduos de todas as raças, credos
e sexos, mas entre indivíduos. Hoje, pouco se fala em comunidades como
uma entidade. Como um organismo único, uno, vivo.
Nesse
contexto social, não me surpreende que muitos se perguntem: “E como ficam as
pessoas que querem trabalhar amanhã? Como ficam os professores que querem dar
aulas? Como ficam os alunos que querem estudar?”. Para nossa concepção
individualista da coisa, pode até mesmo ser revoltante que a liberdade de greve
interfira em todas as outras liberdades individuais daqueles que não querem
aderir. E talvez essas pessoas estejam certas, afinal, o raciocínio faz
bastante sentido.
Veja
bem, não acho que o pensamento individualista seja de todo ruim. Pessoalmente,
sou capitalista e até mesmo individualista. Prezo muito minha liberdade e minha
independência. Mas acontece que, justamente por ser assim, sempre me forço a
lembrar de como sou, de fato, incrivelmente dependente, não importa o quão
livre ou "economicamente" independente eu seja.
Talvez,
apenas talvez, nós precisemos ser lembrados de que para chegar no trabalho,
nós precisamos do motorista de ônibus, do trocador, ou do operador do metrô. Para
que o professor possa dar a aula, o funcionário da escola tem de destrancar a porta
e o inspetor tem que patrulhar os corredores. Essas pessoas também tem liberdade e
opinião, e elas são tão importantes quanto o nosso trabalho ou o nosso estudo. Quem
sabe, até mais.
Eu
avisei a todos na minha empresa que vou trabalhar amanhã. Não quero e não vou
aderir a greve. Avisei, inclusive, que se não tivesse ônibus, metrô ou taxi nas
ruas, eu iria andando para a empresa. Nem que chegue atrasado e suado, eu vou para
a empresa amanhã. Nesse sentido sou não apenas livre para ir andando ao
trabalho como autossuficiente para conseguir fazer isso sozinho.
Mas
se eu chegar lá e não tiver ninguém na portaria para me deixar entrar, eu vou
ficar do lado de fora, ou então voltar pra casa, também a pé. E se meus colaboradores
não chegarem aos seus trabalhos, mesmo que eu entre, não terei tanto trabalho a
fazer. Muitos desses colaboradores, por sinal, não moram a 40 minutos a pé da
empresa, e talvez não consigam ir andando.
Vivemos em sociedade justamente porque,
individualmente, não somos autossuficientes. Até mesmo o capitalismo e a livre iniciativa depende de um sistema de trocas para gerar valor. Somos livres, sim, mas não
bastamos por nós mesmos. Precisamos dos outros para que possamos funcionar, da
mesma forma que estes outros também precisam de nós. E para que nós possamos
exercer nossa liberdade, todos também tem de poder exercer as suas. Não podemos
restringir as de uns em beneficio de outros.