Temos que falar do Oscar

21.1.16



Hoje completamos uma semana da nomeação de filmes e atores para a maior cerimônia do mundo do cinema. Pois é, já passou da hora de falar dela.

Algumas indicações surpreendentes, alguns esquecimentos surpreendentes, e, como era de se esperar, habemus polêmica!

Como alguém que gosta de filmes, mas não entende deles, fingir que posso julgá-los apropriadamente é como dizer que, como canto todo dia durante o banho, eu deveria estar lá, apertando o botão da cadeira do The Voice.

O que posso dizer, por enquanto, é que as indicações, para muitos como eu, servem como uma maneira de consolidar a lista de filmes a serem assistidos no próximo mês, antes da grande cerimônia de premiação.

Tendo dito isso, não é vergonha nenhuma dizer que não assisti a maioria dos filmes indicados, e que tenho muito o que fazer até o dia 28 de fevereiro.

Porém, a vantagem da polêmica é que você não precisa entender do assunto para falar dela.

Então o assunto da vez é a polêmica racial envolvendo as indicações do ano. Poucos foram os últimos anos em que tivemos menos negros indicados, principalmente quando se trata dos prêmios principais da noite. Entre diretores, atores e atrizes, não há um negro sequer, e isso, a princípio, parece ser alarmante. Talvez já prevendo o tom de cor das indicações, o escalado para a apresentação do programa foi o comediante afro-americano Chris Rock.

Ainda assim, antes de sair xingando a galerinha que indica os filmes, há de se considerar o material de Oscar produzido e/ou estrelado por negros nesse último ano. Por isso, passei, filme a filme, pesquisando suas indicações e os reconhecimentos recebidos de outros grandes prêmios da temporada, que não geraram nenhuma polêmica em relação ao racismo.

- Beasts of no Nation: Um filme aclamado, mas que não atraiu tanta atenção das premiações. Ainda assim, Idris Elba foi indicado ao Globo de Ouro de melhor ator coadjuvante, ao BAFTA (British Academy for Film and Television Award), ao SAG Award (Screen Actors Guild) e ao Independent Spirit Award, para filmes de produções independentes. Tê-lo indicado não seria uma injustiça, e poderia ter evitado muito da polêmica em questão. 
Além disso, Abraham Attah foi indicado ao prêmio de melhor ator do Independent Spirit Award, e o prêmio de Melhor Ator Jovem do Critic's Choice (Prêmio de escolha dos criticos de cinema). É importante levar em consideração, porém, que enquanto no Spirit, a competição é apenas entre filmes independentes, não incluindo grande parte das maiores produções do ano, a categoria de Jovem Ator (do Critic's Choice) não existe para o Oscar.

- Concussion: Um filme menos aclamado, que atraiu ainda menos atenção das premiações do ano. Will Smith foi indicado ao Globo de Ouro de Melhor Ator, porém não foi lembrado por nenhum outro prêmio de grande escala pelo filme. Tê-lo deixado de fora não me parece ter sido uma injustiça cometida por sua cor de pele, e sim uma preferencia alternativa do Oscar, que só indica cinco atores por ano. Vale lembrar que o Globo de Ouro indica cinco atores para filmes de drama, e outros cinco para filmes de comédia, enquanto o Oscar apenas indica cinco no geral.

- Straight Outta Compton: Um filme que estreou longe da temporada de premiações, mas que foi um grande sucesso de bilheteria nos EUA. Apesar disso, a crítica positiva não foi espetacular, e o filme não foi nomeado para muitos grandes prêmios. Sendo um filme sobre musica, é surpreendente que sua trilha sonora não tenha recebido nenhuma nomeação dos principais prêmios da indústria, e que suas poucas nomeações foram para o Globo de Ouro de Performance do Grupo de Atores e ao Oscar de Melhor Roteiro Original (escrito por um branco).
Muito se diz que ele merecia uma nomeação de melhor filme, mas me parece estranho que essa revolta tenha surgido apenas após a ultima nomeação da temporada. O filme sobre as origens de um dos mais famosos grupos musicais dos EUA não recebeu reconhecimento de nenhum outro prêmio, seja por sua direção, atuação ou pelo conjunto da obra. Desse modo, não vejo como o Oscar, em especial, tenha sido racista ao deixá-lo de lado, principalmente nas categorias principais.

- Creed: Um filme que também foi muito bem recebido por público e critica, mas que não chamou muita atenção da temporada de premiações. Muitos falam da direção e do roteiro, já adimitindo que a performance de Michael B. Jordan, apesar de muito boa, não teria sido o suficiente para competir com outras grandes atuações do ano. Ainda assim, nem mesmo a direção foi reconhecida por nenhum outro grande prêmio da temporada, tendo apenas o icone branco Sylvester Stalone sendo indicado ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante, e tendo vencido o Globo de Ouro da mesma categoria.

- The Hateful Eight: Um filme de que se esperava muito, e que foi prejudicado pelas altas expectativas. Independente, o filme só consta nesta lista por causa de um ator: Samuel L. Jackson, outro dos possiveis negros indicados ao Oscar esse ano. Enquanto alguns exaltam uma grande performance, outros dizem que sua atuação foi regular, e até boa, mas que não foi merecedora de qualquer indicação. Outra questão em que todos os premios importantes da temporada parecem concordar. O ator não foi nomeado pelo filme a nenhuma das premiações principais da temporada.

Não quero, com essa lista, negar o histórico preconceituoso da Academia, nem dizer que o esquecimento de um dos mencionados acima tenha sido justo. Porém devo dizer que me parece um pouco exagerada a proporção que tomou a falta de indicação de negros nesse ano específico.

Fato é que a polêmica foi levantada pelo Oscar, mas que, entre todos os supostamente esquecidos e prejudicados pelo preconceito na indicação, nenhum deles fez um trabalho que tenha sido indiscutivelmente merecedor de uma nomeação. Se assim o fosse, a polêmica já teria sido levantada pelos outros prêmios da temporada - todos anteriores ao Oscar, diga-se de passagem - que não os indicara.

Mas, enquanto o Globo de Ouro, o BAFTA, o SAG, o DAG (Directors Guild Award) e os outros maiores prêmios tiveram a decência de incluir nomeados negros, mesmo sem premiá-los, o Oscar não o fez. E, talvez por isso, esteja pagando.

O que fica para pensar, porém, é se o fato de incluir uma nomeação de um negro para evitar polêmica - como poderia ter sido feito, por exemplo, com Idris Elba - seria desejável, ou se estamos criando um problema onde ele não existe. Afinal, nada se falou dos outros prêmios, uma vez que um ou outro dos listados aqui foram indicados.

O histórico da academia não ajuda, eu sei. Mas o histórico recente começa a apontar uma mudança. E se vamos acusar alguém de racismo, que o façamos com provas. A única maneira de se provar o racismo desse caso é frente a uma performance indiscutívelmente digna de nomeação, o que não ocorreu esse ano. Não houve um número alto de grandes atuações ou trabalhos de direção, e não houve uma obra que foi claramente ignorada em detrimento de uma claramente inferior por um branco.

Da maneira que vem ocorrendo, a discussão deixa de ser sobre a qualidade da performance merecedora de indicação - e daquelas que foram indicadas em seu lugar - e passa a ser minimamente sobre a presença de uma percentagem de indicados negros. Uma quota a ser obrigatóriamente indicada por ano, para evitar polêmicas com o público e com a imprensa. E isso é prejudicial à academia, ao cinema, aos atores brancos e, principalmente, aos atores negros.

Como uma maneira educada de rebater as criticas que vem recebendo, o Oscar já divulgou posters do evento que ocorrerá no final de fevereiro, lembrando das recentes premiações e da cor daqueles que receberam as estatuetas.





Desse modo, a princípio, não vejo o grande problema que muitos alegam ver. Pelo contrário, por mais que eu acredite que seja importante promover a igualdade racial, acredito que impor um critério racial às nomeações pode ser prejudicial ao valor que elas carregam. Que imponhamos no nosso dia-a-dia, e que reconheçamos que somos todos iguais, merecedores do mesmo respeito. Porém, isso implica dizer que também estamos sujeitos aos mesmos critérios, e que ele não diferirá por causa da nossa cor de pele.

Assim, parece apropriado terminar o texto ao me apoiar no já vencedor do Oscar, Morgan Freeman, e sua opinão sobre o problema do racismo nos EUA.



P.S.: Como leigo, falei dos filmes e atuações que mais chamaram a minha atenção, e sobre os quais tenho ouvido mais reclamações de esquecimento. Outras obras e performances não me são conhecidas, por tanto, não serviram de base para formar a minha opinião. Se alguém tem outras obras para indicar, sintam-se em casa. 

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